| the voice

Chegando à estação de metro de Arroios, ouve-se um cantar ao vivo, sonoro, na voz feminina e forte, presente, marcante, de uma mulher que poderia, facilmente, ser incluída no famoso e reservado clube dos Loucos de Lisboa.

Sem se dirigir a ninguém em particular, a mulher transita em passos calmos de um lado para o outro, enquanto na plataforma todos esperam pelo metro.

Ninguém levanta uma única vez a cabeça para olhar para a mulher que discursa e canta; todos se fecham no seu mundo, provavelmente acreditando piamente que estão a ouvir vozes na sua cabeça. Toda a gente a ouve, ninguém admite a ver.

Infelizmente, por um lado, cheguei à plataforma no final do canto. Felizmente, por outro lado, cheguei no momento em que a figura dá início a um discurso que eu, sorrateiramente, consegui gravar em audio.

Chegado ao meu destino, saí da carruagem com a certeza de ter partilhado uma breve viagem com um bando de loucos ao som de uma única pessoa mentalmente sã - papéis invertidos, rótulos trocados.

Partilho convosco um feliz momento de estranha lucidez.